Valdir Appel – arquivo pessoal

O túnel do tempo nos leva ao domingo, 16 de março de 1969, em que Valdir, goleiro do Vasco, fez o primeiro e único gol contra de goleiro na história do Maracanã. O jogo foi com o Bangu, pela segunda rodada do turno do Campeonato Carioca, atraindo 50.443 pagantes, porque na estreia o Vasco goleou (4 x 1) o São Cristóvão, e o Bangu venceu bem (2 x 0) o Olaria. O Vasco marcou primeiro com o gol do atacante Adilson aos 20, aproveitando o rebote do goleiro Devito, após cabeçada de Valfrido.

O GOL CONTRA – No último lance do primeiro tempo, o atacante  chutou forte de fora da área e o goleiro Valdir defendeu com firmeza. Ao se levantar para repor a bola em jogo, ele tentou lançar com a mão direita o ponta-esquerda Silvinho, mas virou muito o braço. Ao sair de sua mão, a bola foi para dentro do próprio gol, após ainda bater caprichosamente na trave. Dé estava voltando para o meio do campo, de costas, e não viu que havia sido gol.

MUITO BARULHO – Só depois que ouviu o barulho dos torcedores do Bangu comemorando foi que o atacante decidiu olhar e viu o goleiro com as mãos no rosto e a bola bem no fundo do gol. O primeiro a correr para abraçá-lo foi o ponta-esquerda Aladim, remanescente do título que o Bangu havia ganho três anos antes (1966). O árbitro Arnaldo Cesar Coelho sentiu o clima de desconforto e apitou o fim do primeiro tempo, sem que o Vasco desse nova saída.

A VOLTA DIFÍCIL – Mesmo reconfortado por todos os companheiros e adversários, antes de sair de campo, Valdir foi recebido na entrada do túnel pelo técnico Pinga, pelo seu assistente Evaristo de Macedo, pelo preparador físico Carlos Alberto Parreira e o médico Arnaldo Santiago. No intervalo, enquanto os outros jogadores ouviam instruções, Valdir foi com Parreira, que também era treinador de goleiros, para se manter aquecido no campo de grama sintética ao lado do vestiário. Voltou bem para o segundo tempo e fez defesas difíceis, livrando o Vasco de levar a virada em jogo que ficou mesmo no 1 x 1.

APOIO MORAL – O maior incentivo que Valdir pôde ter foi ao voltar para o segundo tempo e conversar, via rádio, com Barbosa, o maior goleiro da história do Vasco, que estava na tribuna e no final desceu ao vestiário para abraçá-lo. Em seu livro Na boca do gol, Valdir conta à noite foi pior que no estádio: “Participei de um programa de televisão e os comunicadores repetiram muito o lance, além de terem insistido em perguntas sobre como havia sido aquilo. Então eu me senti muito pior do que no gramado”.

ATÉ MUDOU DE NOME – Valdir Appel, hoje aos 72 anos, é catarinense de Brusque (1/5/1946). Chegou ao Rio em 63, emprestado pelo Paysandu de Brusque ao América em 65 e no ano seguinte foi para o Vasco, de onde saiu em 72. Trocou de nome, passando a usar Chiquinho, em homenagem ao avô, quando jogou no Bonsucesso, mas não deu certo porque estava marcado pelo gol contra. Saiu do Rio e jogou em mais seis times, encerrando a carreira em 82 no Rio Verde, de Goiás.

Valdir sempre foi dedicado e exemplar no futebol, assim como na vida pessoal, com a esposa Rosélis e os filhos Isadora e Eduardo. Na época do gol contra, ele tinha 22 anos. Eu, repórter de campo, ao lado da trave onde ele fez o gol contra, tinha 29. Mantivemos sempre bom relacionamento e Valdir me honrou com dedicatórias simples, mas muito especiais em seus três livros. 

BOM LEMBRAR – Valdir, Fidélis, Brito, Fernando e Eberval; Alcir (cap) e Buglê (Benetti); Nado (Acelino), Adilson, Valfrido e Silvinho. Brito, zagueiro campeão do mundo em 70. Fidélis, lateral campeão de 66 no Bangu. Alcir, capitão do time que ganhou o primeiro Campeonato Brasileiro em 74. O técnico Pinga foi ponta-esquerda, supersupercampeão e artilheiro (16 gols) do Vasco em 58, e da seleção na Copa de 54 na Suíça. Formou em um dos grandes ataques do Vasco: Sabará, Vavá, Ademir, Pinga e Parodi. Vale dizer: Adilson, autor do gol, era irmão de Almir Pernambuquinho, atacante supersupercampeão de 58.

BANGU – Devito, Cabrita, Lincoln, Luis Alberto e Pedrinho; Juarez e Luis Carlos (Fernando); Mário Tilico, Dé, Parada e Aladim. O técnico era Ocimar, que formou com Jaime o meio-campo campeão carioca de 66, e ainda jogavam o zagueiro Luis Alberto, que fez dupla com Mario Tito, o lateral-esquerdo Pedrinho, reserva de Ari Clemente, e o ponta-esquerda Aladim, que se mudou para Curitiba, onde se tornou comerciante de panificação e também se elegeu vereador.