BRASIL DE AZUL – Depois de cinco jogos, o Brasil disputou a final de 1958 de camisa azul porque a Suécia ganhou o sorteio e teve o direito de usar sua camisa amarela. Em pé, a partir da esquerda, o técnico Vicente Feola, Djalma Santos, Zito, o capitão Bellini (com a taça), Nilton Santos, Orlando e Gylmar. Agachados, Garrincha, Didi, Pelé, Vavá, Zagalo e o preparador físico Paulo Amaral, que gostava de usar boné para encobrir a careca.

Hoje, 29 de junho de 2020, faz 62 anos que o Brasil ganhou a primeira Copa do Mundo, a que marcou o início da consagração de Garrincha e Pelé, estreantes no terceiro jogo – 2 x 0 na então União Soviética, hoje Rússia – e que, juntos, mantiveram-se sem derrota em 40 jogos pela seleção, com quatro empates e 36 vitórias, a última em 12 de julho de 1966, na única vitória – 2 x 0 sobre a Bulgária – em que marcaram os gols, no Goodison Park, em Liverpool, na única Copa promovida e ganha pela Inglaterra.

Vavá marcou o gol de empate, cercado na pequena área pelos marcadores suecos, após bela jogada de Garrincha, que driblou dois e cruzou da linha de fundo.

PRIMEIRA VEZ – Na tarde nublada do domingo, 29 de junho de 1958, no estádio de Rasunda, em Estocolmo, Suécia e Brasil fizeram a primeira final de Copa do Mundo entre europeus e sul-americanos. A Suécia chegou à decisão só com menos um gol que o Brasil (10 a 11), após vencer o México (3 x 0), Hungria (2 x 1), 0 x 0 com País de Gales, 2 x 0 na União Soviética e 3 x 1 na Alemanha. Um remanescente da goleada (7 x 1) para o Brasil, na Copa de 50, ainda jogava: o ponta Skoglund, e o técnico era o mesmo: George Raynor. Bom lembrar: no Maracanã, a Suécia ficou em terceiro lugar na Copa de 50, vencendo (3 x 1) a Espanha.

FAVORITO – O Brasil entrou mais credenciado e confirmou o favoritismo, depois de 3 x 0 na Áustria, 0 x 0 com a Inglaterra, 2 x 0 na União Soviética, 1 x 0 no País de Gales (primeiro gol de Pelé em Copa do Mundo) e 5 x 2 na semifinal com a França. Na final, a Suécia fez 1 x 0 logo aos 4 minutos, gol do capitão Liedholm, em linda jogada individual, mas em duas jogadas geniais de Garrincha, driblando dois em ambas, Vavá empatou aos 9 e fez 2 x 1 aos 32 minutos.

MAIS BONITO – Na volta do intervalo, Pelé fez o gol mais bonito da Copa de 58, matando no peito o lançamento de Nilton Santos e dando um lençol no zagueiro Gustavsson, aos 10. O quarto gol foi de Zagalo, aos 23, por baixo do goleiro. Simonsson, aos 35, fez o segundo gol sueco, e aos 44, Pelé aproveitou o cruzamento de Zagalo e fechou a goleada. Com a cabeçada, Pelé, aos 17 anos e 249 dias, encobriu o goleiro, que se agarrou à trave direita, em desespero, na última tentativa para evitar que a bola entrasse.

Pelé, campeão do mundo aos 17 anos, chora no peito de Gylmar, ao lado de Didi, o Craque da Copa de 1958

O CRAQUE – A FIFA elegeu Didi, aos 29 anos, o Craque da Copa de 1958. Quando a Suécia fez 1 x 0 aos 4 minutos, ele foi ao fundo do gol, pegou a bola e caminhou sem pressa para a nova saída. Uma das cenas mais marcantes daquela final. Bom lembrar: Didi foi titular em todos os jogos de três Copas (54, 58, 62). Na seleção, de 6/4/52 a 17/6/62, o notável Didi fez 73 jogos – 52 vitórias, 12 empates, 9 derrotas – e marcou 21 gols.

CAMISA AZUL – Os jogadores não gostaram, ao saber que a seleção não usaria a camisa amarela na final. Paulo Machado de Carvalho, chefe da delegação, teve uma ideia que os convenceu: “O azul vai nos dar ainda mais sorte. É a cor do manto de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira do nosso Brasil”. O roupeiro Francisco Assis, do Vasco, só encontrou camisa azul na pequena localidade de Boras, a 20 km do hotel da seleção, em Hindas. Por 18 camisas, ele pagou 200 coroas suecas (45 dólares).

ATÉ DE MANHÃ – Tão difícil quanto encontrar as camisas azuis, foi recortar das camisas amarelas o escudo e os números para colocar nas azuis com agulha e linha branca. Francisco Assis me contou tempos depois, em São Januário, que o trabalho foi grande e que chegou a cochilar durante a madrugada, só conseguindo dormir depois das seis da manhã e acordar direto para o almoço. A delegação brasileira só mandou os nomes. Os números foram colocados por um funcionário da FIFA, que não sabia quem era quem na seleção…

CASUALIDADE – Pelé tornou famosa a 10, que virou símbolo de artilheiro, por mera casualidade. O goleiro Gylmar era camisa 3Djalma Santos (4), Bellini (2), Orlando (15), Nilton Santos (12), Zito (19), Didi (6), Garrincha (11), Vavá (20), Pelé (10) e Zagalo (7). O técnico Vicente Feola só entrou na foto por insistência dos jogadores. Diferente do preparador físico Paulo Amaral, que não perdia chance de aparecer. Poucos sabem: Feola só escolheu Bellini capitão, depois da recusa de Didi e Nilton Santos.

O capitão Bellini, com a taça, ao lado de Holger Bergérus, presidente da Federação Sueca, e à direita Paulo Machado de Carvalho, chefe da delegação, e Luis Murgel, diretor de relações internacionais da então CBD.

TAÇA NO ALTO – Foi por insistência dos fotógrafos que Bellini ergueu a taça o mais alto que pôde. Ao recebê-la no pódio de madeira, o capitão ficou com ela ao peito, até que Jader Neves, da revista Manchete, explosivo como sempre, gritou para que levantasse a taça. Quatro anos mais tarde, Bellini perdeu a posição, mas o substituto Mauro, seu reserva em 58, repetiu o gesto no Chile, em 1962. O último a erguer a Jules Rimet, foi Carlos Alberto Torres, o capitão mais jovem da história das Copas, em 1970.

VOLTA OLÍMPICA – A Copa do Mundo de 1958 foi a sexta da história das 21 Copas e a segunda consecutiva das quatro disputadas na Europa: 1934 na Itália, 1938 na França, e 1954 na Suíça, 1958 na Suécia, depois das duas na América do Sul: 1930 no Uruguai e 1950 no Brasil. Pela primeira vez, durante a volta olímpica, uma seleção campeã comemorou com a bandeira do país-sede, o que deixou os suecos ainda mais sensibilizados com o gesto dos brasileiros.

TODO CUIDADO – Os suecos cobriram o gramado com lona para evitar que a chuva forte prejudicasse o nível técnico da final e antes do jogo deram os retoques com rodos. 49.737 pagaram para ver Suécia 2 x 5 Brasil, no estádio de Rasunda, no bairro de Solna, região metropolitana da capital Estocolmo. Inaugurado em 18/4/1937, Rasunda foi demolido em 2007, e a Friends Arena, com cobertura retrátil, inaugurada em 2012, com 50 mil lugares para o futebol e 65 mil lugares para eventos artisticos.

INÍCIO E FIM – A final da Copa de 1958 foi apitada pelo francês Maurice Guigue – 1912 – 2011 -, que por coincidência havia atuado na estreia do Brasil (3 x 0 na Áustria), dia 8 de junho, no estádio de Udevalla. Vinte anos depois, ele foi o segundo francês em decisão, depois de Georges Capdeville – 1899 – 1991 – ter apitado Itália 4 x 2 Hungria, em 19/6/1938, no estádio Colombes, em Paris.

BOLA DO JOGO – Guiguepretendia ter a bola da final Suécia 2 x 5 Brasil como lembrança, mas não contava com uma surpresa, ao mantê-la presa ao braço: o massagista Mario Américo – 1912 – 1990 , já em sua terceira Copa, aproximou-se por trás dele e “roubou” a bola, saindo em disparada na direção do vestiário. Estava atendendo a um pedido de Paulo Machado de Carvalho- 1901 – 1992 , chefe da delegação, e hoje nome do estádio do Pacaembu, onde a bola pode ser vista no Museu do Futebol. 

HOMENAGEM DO SANTOS -O Santos FC publicou hoje (29) bela homenagem aZito, líder e capitão do time durante 15 anos, Pelé – o mais jovem campeão do mundo – ePepe (suplente de Zagalo). O clube inseriu na mesma mensagem, em suas redes sociais, o registro dos 68 anos da estreia de Zito, em 29/6/52, no amistoso em que o Santos venceu (3 x 1) o Madureira, na Vila Belmiro.

José Ely de Miranda (Zito 1932 – 2015 – , 733 jogos, 57 gols, primeiro brasileiro bicampeão (62-63) da Libertadores e do Mundial de clubes, foi também nove vezes campeão paulista e quatro vezes do Rio-São PauloNa seleção, de 17/11/55 a 25/6/66, 50 jogos com 38 vitórias e 3 gols, o mais importante na final da Copa de 1962 (3 x 1 na Tchecoslováquia). Um dos notáveis e imortais da história gloriosa do Santos FC e da única seleção brasileira que ganhou duas Copas consecutivas.

Fotos: AP, Blog TrÊs Pontos, goal.com