Um dos notáveis do futebol, Jairzinho detém a marca histórica de único das 21 Copas do Mundo, de 1930 a 2018, a ter feito gol em todos os jogos da primeira seleção brasileira campeã com 100% de aproveitamento. Ele marcou sete gols em seis jogos, consagrando-se no mundo como o Furacão da Copa de 70. O repórter-fotográfico Marcelo Santos registrou nosso encontro com Iata Anderson e Jairzinho para o canal RESENHA no youtube. Veja e inscreva-se.
O ATAQUE DOS SONHOS
– Algo inesquecível na sua vitoriosa e brilhante carreira, Jairzinho?
– Ter sido centroavante, ao lado de Didi e Amarildo, com Garrincha e Zagallo nas pontas. Sempre me emociono e me dá vontade de chorar de tanta alegria de ter formado um ataque de sonho na realidade da minha história no futebol.
– Garrincha ou Pelé?
– Garrincha. Garrincha foi o melhor na Copa de 58 e na Copa de 62. Fez gol de cabeça, fez gol de falta e carregou a seleção nas costas depois que o Pelé se contundiu no segundo jogo. Garrincha foi o maior driblador e o maior homem-show. Tive a honra de jogar com ele, no Botafogo e na Copa de 66. Genial.
– Qual a melhor seleção brasileira campeã?
– A de 70, nenhuma dúvida. Nenhuma outra teve os camisas 10 de seus times como a de 70. Eu era 10 no Botafogo; o Gerson era 10 no São Paulo. O Tostão era 10 no Cruzeiro. O Pelé era 10 no Santos, e o Rivelino era 10 no Corinthians. O 10 sempre foi o número de referência; hoje qualquer um pode jogar com a 10, vulgarizou.
– Gerson ou Didi?
– Didi. Gerson foi bom, mas o Didi foi melhor. Titular de duas Copas em todos os jogos, como também foram Nilton Santos, Zagalo e Gilmar.
– Gilmar ou Manga?
– Manga. Joguei com os dois na seleção. O Manga era mais goleiro.
– Garrincha, Didi, Quarentinha, Amarildo e Zagalo ou Rogerio, Gerson, Roberto, Jairzinho e Paulo Cezar?
– Aí não dá para escolher. Dois ataques maravilhosos, na época boa em que se escalava ataque com cinco. Hoje não encontram nem dois para escalar, quanto mais cinco.
OS MELHORES
– Você aprendeu mais jogando ou com os técnicos?
– Aprendi muito em campo, mas não deixo de reconhecer as boas orientações que recebi de todos os meus técnicos, desde o tempo de juvenil com o Paraguaio, o querido Egídio Landolfi (Nota do repórter: Paraguaio, Geninho, Pirilo, Otávio e Braguinha foi o ataque do Botafogo, campeão carioca de 48, só com a derrota na estreia por 4 x 0 para o São Cristóvão, em General Severiano. Nilton Santos dizia que foi campeão invicto porque só estreou na segunda rodada).
– Feola, Aymoré, Zagalo, quem foi teu melhor técnico?
– Meu só, não, Zagalo foi o melhor técnico de sempre, o melhor do mundo. Mil anos na frente dos outros. Mas quero dizer que no início da carreira, na medalha de ouro do Pan-Americano de 63, que ganhamos em São Paulo, tivemos um bom técnico de base, o Antoninho. Ele ajudou muito na minha formação na seleção e na formação do nosso capita Carlos Alberto Torres.
– Qual foi o diferencial da Copa de 70?
– A preparação física do Admildo Chirol, que já trabalhava com a gente no Botafogo e foi pra seleção quando o Zagalo assumiu. Não tenho muitas palavras para dizer o quanto foi importante e decisivo o trabalho do Chirol. A seleção voava em campo, tanto que a maioria dos nossos gols foi no segundo tempo, quando os adversários não aguentavam nosso ritmo. O Chirol foi um preparador fisico muito além do tempo dele.
– Os jogadores influíram na escolha do Carlos Alberto Torres como capitão?
– Não, a gente nem pensava nisso. A decisão foi da comissão técnica, e não poderia ter sido melhor. O capita não tirava só o cara ou coroa, não. Quando era preciso, ele chegava junto. No jogo com a Inglaterra, o Lee (Francis Lee, ponta) atingiu o Félix e o Carlos Alberto chegou junto, e o Lee recuou. O capita era decidido.
– E o João Saldanha?
– Era bem objetivo, direto no que queria. Logo no primeiro treino ele chegou com um pedacinho de papel rascunhado e falou com a gente: essa é a seleção que vai jogar. Mandou bem quem o chamou de João sem medo. Ele era corajoso.
BOTAFOGO E SELEÇÃO
– Você fez 412 jogos, 189 gols, ficou bicampeão carioca 67-68 e ganhou vários torneios internacionais, fora do Brasil, com o Botafogo? Grandes lembranças?
– Grandes e muitas. Ganhamos torneios no México e os torcedores já nos conheciam antes da Copa. Os mexicanos nos apoiaram muito, principalmente no jogo com a Inglaterra. (Interrompi Jairzinho para lembrar que os ingleses se isolaram no último andar do Hotel Hilton, em Guadalajara, e mandavam vir água e carne da Inglaterra, o que irritou os mexicanos).
– E hoje, Jairzinho, qual é o sentimento com o Botafogo na Série B?
– Dói, machuca. É o resultado de anos de gestões ruins. O clube paga, o torcedor sofre. Nós que fizemos muito pelo clube, sentimos, mas também não podemos fazer nada para mudar a situação.
– O Brasil ganha a Copa no Catar ou completa cinco Copas sem Copa?
– Torço sempre a favor, mas está complicado. Saímos no meio do caminho nas duas últimas e precisamos melhorar na próxima. Perdemos a Copa América no Maracanã e vimos a evolução de seleções na Eurocopa. Precisamos reagir e melhorar porque o cenário não é favorável, não.
– Li matéria em que escreveram que você foi gandula no Botafogo…
– Não teria sido nada demais se tivesse sido, mas não fui. Morava perto, ia ver treinos e jogos, mas não fui, não. Nem sei como inventaram essa história. Deve ter sido alguém que não tinha assunto para completar a matéria.
– Por que nem sempre o bom jogador é bom técnico?
– Pode ser porque não saiba ensinar o que aprendeu ou porque o jogador não faça o que o técnico pede.
– Jogador de clube e jogador de seleção, verdade ou história?
– Já tivemos vários exemplos de jogadores que arrebentam no clube, mas não rendem tanto na seleção.
– Sou amazonense, nacionalino, e quero saber se você se lembra de quando jogou no Fast em 79?
– Eu me lembro de todos os times em que joguei, e tenho muita lembrança do Fast, principalmente no amistoso com o Cosmos de Nova York, com Carlos Alberto Torres, Beckenbauer e outros craques, no Vivaldão lotado. Foi uma festa maravilhosa em Manaus, não posso esquecer nunca. Tinha uns 50 mil torcedores no estádio, coisa linda.
Foto: ocuriosodofutebol